domingo, 3 de fevereiro de 2013

Peixinhos nos pés, ou Fish Massage


Desde que chegámos a Siem Reap que isto estava na minha ideia: fish massage. Sim, certo, também queria ir (e fui) às outras massagens, que são divinais (sem happy ending), mas estas captaram-me de imediato a curiosidade. Deixar que uns peixinhos te comam toda a pele morta dos pés é uma experiência.... única, sim.

É que não são os peixinhos que vemos nos nossos centros comerciais, que são quase girinos, não, são tanques cheios de peixes de tamanho.... olha, de tamanho de peixe, pronto! :)


Qual é então a teoria? Bom, os peixes alimentam-se da nossa pele morta e, por conseguinte, fazem-nos algo parecido com uma esfoliação, que é uma renovação da pele, retirando a pele morta para que a pele se renove.


Depois de ver o preço então, mais convencido fiquei que era um item a não perder. Custava 1 dólar 15 minutos e ainda te ofereciam um refresco... e pronto, lá fui. Ao início, há um choque. Para mim que não tenho cócegas nos pés, foi relativamente pacífico, mas para quem sofra desse mal, prepare-se, porque vai ser dolorosamente engraçado. Depois de nos habituarmos, fica normal e já quase nem damos pelos peixes que se vão banqueteando com a nossa pele morta.

Este é um negócio quase perfeito para os comerciantes, que apenas têm de limpar os excrementos que os peixinhos vão deitando fora e mudando a água, já que comida são os clientes que fornecem aos bichos... 

A experiência foi fantástica, como podem ver pelo vídeo e pelas fotos, e é claramente uma experiência a repetir, se voltar para aqueles lados do mundo alguma vez mais...


O milagre da vida numa palhota

Moçambique, província do Niassa, cidade de Cuamba, novembro de 2005

A Missão do Mitucué é um local extraordinário. Fica localizada no sopé de um monte com cerca de 300 metros de altura, que se eleva na vasta planície que compõe a zona da cidade de Cuamba. Parece protegida e segura, como se nada ali pudesse entrar ou fazer mal. O silêncio era de tal forma presente que não deixou ninguém indiferente. A única coisa má eram, de facto, as formigas. De um tamanho fora do normal, atacavam quem se aproximasse, provocando imensa comichão. Infelizmente, o tempo era de chuva e não estava ninguém na missão, pelo que não pudemos visitar as instalações nem a igreja. Assim, aproveitámos para, de carro, ir dar umas voltas às aldeias circundantes.


Depois de um tempo, a chuva acalmou e permitiu-nos subirmos a um monte para contemplarmos a vista que era, naquela zona, simplesmente fantástica. Na descida, cruzámo-nos com um grupo de crianças que por ali brincavam. Rapidamente se juntaram a nós, porque éramos arungus (palavra que significa Branco) e, principalmente, porque levávamos câmara fotográfica. Ainda hoje me surpreende o espanto que elas sentem quando lhes tiramos fotografias e quando se vêem retratadas no visor da câmara. É, para elas, algo difícil de entender, quase como se de magia se tratasse, e por isso elas ficam doidas Depois de umas fotos que elas adoraram, descemos e fomos para o carro.


Ao chegarmos lá, um senhor acenava-nos ao longe para lhe irmos tirar uma fotografia. Confesso que não tinha muita vontade de lá ir, mas lá acedi ao seu pedido e fui, juntamente com a Sara. Quando chegámos perto dele é que percebemos que o alvo da fotografia era um bebé, seu filho. Perguntámos que idade tinha e ele respondeu-nos que tinha 2 meses. Olhei para a Sara e entreolhámos os ombros, como quem diz: “Sim, e?”. Só quando estávamos a chegar perto da criança é que ele emendou o que tinha dito: não eram 2 meses, mas sim 2 dias… Aquilo só mesmo visto: uma criança com 2 dias, envolta em 2 capulanas, estremunhava deitada numa esteira à porta de uma palhota no meio de África. A emoção que senti foi indescritível, pois nunca tinha estado em contacto com um bebé daquela idade, principalmente naquelas condições, com todo o pó e pobreza que o rodeava. A mamã dele estava lá ao seu lado, na boa, sem qualquer tipo de limitação ou dor. Duvido que aquele tivesse sido o primeiro, daí a descontracção da senhora. O bebé era extremamente engraçado, pois os negros, ao nascerem, não têm ainda a pigmentação dessa cor, ou seja, nascem brancos, como nós, o que dava ao retrato que encontrámos uma tonalidade um pouco diferente da que estamos habituados…


Fizemos algumas festas ao recém-nascido, com todo o cuidado e cautela, quase com medo de o partir, e tirámos as fotos pretendidas pelo senhor. Entretanto, perguntei-lhe como se chamava a criança, ao que me foi respondido que ainda não tinha nome. De repente, o senhor diz: “querem ser vocês a dar o nome?”. Olhámos um para o outro e rimo-nos. Perguntei se era rapaz ou rapariga e disseram que era rapariga. Escolhemos, então, o nome óbvio: Sara, já que mais nenhuma das meninas lá estava. Eles riram-se e aceitaram, quase que orgulhosos por terem uma filha com um nome escolhido por arungus. Foi aí que surgiu a parte pior: o senhor pediu então que voltássemos lá para visitar a Sara e ver como estava a crescer. Olhei para cima, pois eu estava de cócoras, e respondi: “Não posso vir, vou embora a Portugal”. Nesse momento, invadiu-me uma sensação de tristeza e desconforto como até então nunca tinha surgido, pois foi a primeira vez que, ao fim de 15 meses naquela terra maravilhosa, me bateu a ideia forte de que me ia embora.


Não sei se esta menina alguma vez vai ficar a saber que, dois dias depois de nascer, foi visitada por dois brancos que por ali chegaram seguindo o Mitucué, que se elevava alto no céu, orientando o seu caminho. Alguém lhes anunciou a Boa Nova do seu nascimento e eles apressaram-se a ir contemplar e prestar a sua homenagem, tendo partido depois para nunca mais voltarem. Não levaram presentes, mas levaram uma câmara fotográfica que eternizou aquele momento para toda a história e distribuíram simpatia e carinho por todos os que ali estavam e que também tinham acorrido quando ouviram a notícia do nascimento. Parece-vos familiar a história?

O início...

O chá, a tagine, o azulejo, a escultura, o vitral, o sorriso, o lamento, o grito, a dor... elementos minúsculos de uma existência pequenina e insignificante no mundo tão antigo como ele próprio. Gosto de me chamar cidadão do mundo, como o grande visionário Baden-Powell disse que todos os escuteiros devem ser. Conheço pouco do mundo, daquele que está lá longe, e deste que está aqui bem perto. Conheço pouco, mas quero conhecer mais. Quero abrir as asas e voar, chegar onde conseguir e conhecer tudo e todos.

Partilhar histórias, registar momentos, trazer de volta vivências, que depois, com a humildade subjacente a quem sabe que pouco ou nada conhece deste mundo tão vasto e, ao mesmo tempo, tão pequeno, colocarei aqui, para meu deleite pessoal, antes de mais, porque escrever o que sabemos, conhecemos e amamos obriga-nos a viver de novo aquilo que nos deixou tanta saudade.

Em segundo lugar, deixar a porta aberta para que tu possas entrar, neste cantinho que fala do mundo que se conhece, e possas tomar conta de que mundo é este, e assim ganhares vontade de que o meu mundo possa ser, também, o teu mundo. Histórias de viagens, momentos loucos que deixaram marca e que, agora, passarão para este "papel", à velocidade que o tempo me deixar e a preguiça permitir.

Obrigado por me acompanhares nesta jornada. Vem daí!